Ontem eu tive que sair um pouco mais cedo do trabalho pra dar tempo de passar na farmácia antes de ir pra casa. Desci do ônibus perto do Pimenta's, o bar mais burga daqui. Provavelmente o chopp mais caro da cidade, com a tradicional elite local e seus carros importados exibidos na calçada da frente.
Enquanto eu esperava para atravessar a rua, peguei no ar a frase "a juventude socialista, no Rio de Janeiro...". E não ouvi mais nada. Não por causa do barulho do ônibus que passava no momento, mas porque me deu uma raivinha.
Virei pra trás e vi um senhor bem vestido, tomando um chopp, acompanhado de dois caras mais jovens, por volta da minha idade, típicos boys daqui. E aquele senhor, com aquele chopp, com aquele ar intelectual, profanando a frase "a juventude socialista, no Rio de Janeiro"... quem era ele pra ousar falar de juventude socialista num bar daqueles, com aquela companhia?
O rapaz da direita fumando um cigarro ouvia o velho atento. O da esquerda, com uma capirinha cheia sobre a mesa, me encarava. Carrancudo.
Fingi que não era comigo e segui meu caminho, com o sangue quente. Mas com que direito eles...
Passei na farmácia, comprei meus remédios e tornei a pé pra casa. Lembrei dos três do Pimenta's e da juventude socialista no Rio de Janeiro. E voltou a raivinha. Não porquê aqueles riquinhos falavam de socialismo - nem sei se criticando ou elogiando - mas porque, no fundo, eu é que queria estar lá. Num dia de semana, em horário comercial, tomando um chopp, falando de socialismo com minha Z3 na calçada, sem me preocupar se é começo ou fim de mês, porque sempre vou ter dinheiro na minha conta pra pagar o cartão de crédito.
Se bem que... não, não. Se eu fosse podre de rico mesmo, eu seria é hippie.